Publicidade, sociologia e estética no trabalho de Fred Forest
Mario Costa
O trabalho de Fred Forest sempre resulta de uma combinação de três fatores fundamentais , ou seja o fator publicitário, o fator sociológico, o fator estético. Estes três componentes agem de modo diferenciado conforme à natureza das operações que o artista realiza e conforme os diversos períodos de sua atividade.
Forest foi um dos primeiros a entender que o universo das informações e da cultura é doravante inteiramente dominado pelos meios de comunicação de massa e pelas novas tecnologias da imagem, dos sons, da escrita, da communicação.
Ha mais de trinta anos ele tenta desesperadamente fazer com que a arte sobreviva, impulsionando esta última a assimilar as formas e a lógica das mídias ou a dominar as mídias e as tecnologias forçando estas à assumir uma espécie de estatuto e de « aura » estéticos.
1) No que diz respeito ao fator publicitário (arte como propaganda da arte, arte como propaganda de si mesma, arte como dispositivo contendo dentro de si a lógica da propaganda, arte funcionando como a propaganda...), as operações de Forest nascem na constatação da ineficácia também como na marginalidade dos microcircuitos artísticos, contra os quais elas vão opor estratégias de expansão dos dispositivos da arte e de seus instrumentos.
Trata-se sempre, para ele, de tornar cada vez mais eficaz a informação e sua força de penetração. O conceito de base da "Teoria da Informação" afirma que a quantidade de informações contidas num signo é inversamente proporcional à probabilidade do próprio signo. Um signo previsível e esperado possui uma pequena quantidade de informações enquanto, ao contrário, um signo inusitado e inesperado contem uma grande quantidade de informações. As operações de Forest são sempre signos altamente improváveis ; neste sentido, elas são o veículo de uma grande quantidade de informações, provocando um crescimento da atenção e uma ampliação do espectro de contato, e ele utiliza tudo isso para demonstrar e colocar em evidência, como artista, a arbitrariedade ou o absurdo dos sistemas da communicação social : o espaço em branco num jornal (Le Monde, 12 de janeiro de 1972), o vazio na transmissão televisiva (um minuto de interrupção bem no meio de um jornal de TV , o 2º canal nacional francês, 1972), os cartazes em branco numa passeata (« O Branco invade a Cidade », São Paulo, 1973), uma fotografia através da televisão (O tele-espectador fotografado, RTB, 1976), um close sobre um telefone durante dez minutos na televisão (Celebração do Presente, Salerno, 1985) … Todos eles são signos altamente improváveis que vão despertar e mobilizar a atenção du público. Deste ponto de vista, as operações de Forest possuem um grande potencial publicitário e o próprio pode aparecer como agente publicitário de um novo gênero. Um gênero do qual as agências de propaganda ainda não vislumbraram todos os recursos… Forest aliás poderia muito bem vender suas idéias e utilizá-las para estimular a consumação de qualquer produto. Enquanto isso, à espera de uma finalidade publicitária que obviamente não focaliza o lucro, suas idéias vão se catalizar num tipo de tautologia informacional. Tautologia informacional na qual a operação faz propaganda para si mesma e para seu autor. O que contribui a fortalecer a perturbadora conotação estética que lhe pertence.
Podemos assim testemunhar um tipo de paradoxo : uma prática artística "marginal" que afirma sua própria " extérioridade " em relação aos circuitos oficiais da arte ; que funciona como um agente reanimador destes circuitos, eles mesmos obsoletos e marginais no universo atual da informação. Desta forma, é o conjunto do sistema oficial da arte que vai aparecer como verdadeiramente " marginal ", enquanto que, na prática artística de Forest, abertamente " marginal ", é necessário enxergar a última tentativa de recriar um sistema de comunicação artística mais operacional e adequado à realidade de nosso tempo.
2) Como fundamento das operações socio-estéticas de Forest, existe a ampliação do conceito de "medium ".
Este conceito se propaga do campo especificamente tecnológico até o campo mais amplo do " social " : a própria sociedade se apresenta como um conjunto de dispositivos que podem
ser desviados de várias maneiras : por tipos de funcionamento não habituais que os fazem agir uns contra os outros, revelando e ridiculizando sua lógica .... Com o recurso da simulação de situações, a lógica dos dispositivos colocados em jogo (a bolsa da Bolsa do Imaginário de 1982 ; os mecanismos de compra e venda do Metro Quadrado Artístico de 1977 ; a exposição de Madame Soleil no museu Galliera ou na Bienal do ano 2000 de 1975 ; a política e seu discurso da Conferência de Babel de 1983, etc. até seu Chemin de croix [Via Sacra] de 2005 em Nice na Galeria Christian Depardieu) passa por estados latentes, ou revelados, que colocam em evidência o arbitrário, o absurdo ou a violência de seus mecanismos . O " jogo socio-estético " de Forest está ao oposto da partida trágica realizada pelo terrorismo contra as instituições e os Estados, entretanto podemos considerar que a lógica que sub-entende as duas coisas é idêntica. É incrível constatar como a sociologia acadêmica e oficial conseguiu ignorar as grandes possibilidades de renovação, através de operações como as que Forest realiza. Poderíamos dizer que Forest mostra à sociologia a maneira de construir autênticas situações experimentais, e fornece indicações muito preciosas sobre as metodologias de pesquisa. Metodologias de pesquisa que permitiriam ultrapassar a estéril oposição entre uma sociologia ainda inspirada do positivismo, petrificada em métodos tradicionais que se limitam aos questionários e à estatística, e uma sociologia perigosamente subjetiva, ou, pior ainda, literária, principalmente na França. Forest proporciona, na minha opinião, as informações necessárias para fazer da pesquisa sociológica uma prática rigorosamente experimental e entretanto inesgotavelmente criativa.
3) Nas operações ligadas à perspectiva da " arte sociológica ", a qualidade estética resultava da superposição de territórios de significados heterogêneos : os processos de intervenção notados pelos vanguardistas (de Duchamp ao Surrealismo e aos Situacionistas) aplicados à pesquisa social, o " social " como novo suporte para o exercício da criatividade, a solicitação à participação, a crítica pelo humor, a tautologia publicitária, o conceito expresso como representação e encenação… Tudo isto, e mais algumas coisas, estava reunido nas operações de Arte Sociológica de Forest, conferindo-lhes uma qualidade estética ao mesmo tempo perturbadora e indefinível.
Mas, há cerca de vinte anos, a atividade de Forest mudou significativamente e a qualidade estética de suas criações apurou-se, alcançando algumas vezes uma pureza toda metafísica. A sociologia ainda estava num nível de superfície que precisava ser ultrapassado em direção aos significados e às estruturas antropológicas (à procura do absoluto espaço-tempo ?) ; a animação, a provocação, o moralismo… contidos nas operações da " arte sociológica ", são resíduos extra estéticos que deviam ser eliminados para a realização de uma forma pura da estética.
Um pressentimento desta nova estética já existia na obra de Forest, em sua operação de 1973 : " Rue Guénégaud Archéologie du Présent ". Nesta ação, o público era convidado numa galeria de arte para observar, em tomada televisiva direta, a vida que acontecia na rua. Já existem neste trabalho implicações conceituais e estéticas que são bem diferentes daquelas da " arte sociológica " que paradoxalmente, entretanto, iria afirmar-se nos anos seguintes. De fato, a operação "Rue Guénégaud. Archéologie du Présent" já interpela noções tais como " espaço-tempo ", " realidade tecnológica " etc. Desde outubro de 1983, Forest voltou assim à sua primeira inspiração : a Estética da Comunicação, na qual ele trabalha com minha contribuição, no plano teórico.
Em conclusão, podemos constatar que a situação antropológica atual se caracteriza por uma conjunção totalmente nova da mente e da máquina. As tecnologias da informação de hoje desproveram o nível sociológico de seu interesse, enquanto criaram uma nova sensibilidade e novas formas de espaço-tempo. As operações estéticas, totalmente puras, devem trabalhar com as estruturas formais da comunicação e tornar sensível esta nova condição humana instaurada pela tecnologia elétrica e eletrônica. As ações de Forest (Ici et maintenant, [Aqui e agora] 1983 ; Hommage à Yves Klein, [Homenagem à YK] 1984 ; Célébration du présent [Celebração do presente], 1985 ; Hommage électronique à Mondrian [Homenagem eletrônica a Mondrian], 1989...) são testemunhos edificantes.
Desde 1995, como era natural, Forest, mais uma vez fascinado pelas novas ferramentas da comunicação tecnológica à distância, converteu-se totalmente ao uso da Internet cuja lógica ele tenta explorar (De Casablanca à Locarno; l'amour revu et corrigé par Internet [o amor revisitado e corrigido pela Internet] 1995; La machine à travailler le temps [A máquina que trabalha o tempo] 1997; Dansons, dansons[Dancemos, dancemos] 2000, Le corps éclaté[O corpo detonado] 2002, Digital Street Corner [Esquina Rua Digital 2005, 1997 …) e que ele procura fazer funcionar de maneira estética. J'arrête le temps [Eu paro o tempo] 1998, Le centre du monde (O centro do mundo) 1999, Le cyber-mariage [O Ciber-Casamento] 1999).
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